AUTORA NO TEMPO DA SUA INFÂNCIA
Com esta semana de chuva e frio que marca o início efetivo do
Inverno em tempo real, uma vez que pelo calendário já começou há algumas
semanas, recordo-me de outros Invernos e recuo de novo, até ao tempo da minha
infância.
Uma das primeiras recordações
que tenho do Inverno, foi de um dia de queda intensa de granizo, tão forte e em
tanta quantidade, que tapou todo o peitoril da janela, da sala de nossa casa na
aldeia, de onde eu espreitava do lado de dentro, muito surpreendida e também
desejosa de abrir a janela e brincar com aquelas bolinhas brancas e frias.
Claro que a minha mãe não deixou, e imagino que me terá tentado explicar que
podia constipar-me. Mas essa parte já não me lembro, só imagino, pela
comparação com o que os pais costumam fazer com os filhos.
Recordo também quando ia para a escola, atravessando os campos
pelas estradas rurais, com as outras crianças, dos campos cobertos de geada,
todos brancos e do encanto que sentia com toda aquela brancura e da luz do sol
nascente, cujos raios incidiam nos cristais, fazendo brilhar esplendorosamente
toda a paisagem.
Mas era muito frio e as nossas mães, para nos aquecerem as mãos
e os sapatos antes de sairmos de casa, na falta de luvas e outros agasalhos,
colocavam pedras redondas entre as brasas da lareira, para aquecerem, as quais
depois enrolavam em papeis de jornal, para levarmos nas mãos e nos aquecerem. O
pior aconteceu, quando uma das pedras estava quente demais e pegou fogo ao
papel, provocando apenas um susto, pois de imediato a criança a jogou fora.
Com os sapatos, eram brasas incandescentes que eram colocados lá
dentro e abanados os sapatos, para aquecerem com o contato das mesmas, que eram
jogadas de volta à lareira, quando os seus donos, tinham que os calçar, para
partir.
Também recordo as brincadeiras nos regatos que se formavam,
quando voltávamos da escola. Havia um rapaz mais habilidoso que fabricava
pequenos moinhos de cana, e represava as águas, formando pequenas lagoas, de
onde encaminhava as águas por um pequeno cano, fazendo assim mover os moinhos e
colocando-se em evidência, perante as meninas encantadas, é claro.
Por falar em ribeiros, não havia pontes, e num local, tínhamos
que atravessar o ribeiro, pulando de pedra em pedra, com as mochilas ás costas.
O pior foi uma vez em que o pé escorregou e tomei um banho
forçado, com a mochila incluída. Mas tinha também a parte mágica, de ir
espreitar os locais onde cresciam as violetas selvagens e os junquilhos
brancos, cujos perfumes embriagantes me deleitavam. Cresciam nas margens dos
regatos e ribeiros, em locais aconchegados, que fui aprendendo a descobrir e
marcar de ano para ano, para ir descobrir quando floresciam durante o Inverno e
início da Primavera.
A meio do Inverno, tínhamos dois períodos alegres no entanto.
Era o Natal e a Passagem de Ano, quando havia a festa anual da aldeia, pela
qual esperávamos um ano inteiro, pois era o único divertimento que conhecíamos
nessa altura, e os únicos dias do ano, em que tínhamos comidas melhoradas e
doces. Também recebíamos visitas de amigos e parentes de longe. A festa também
nos animava, com a música, a quermesse, o arraial, os bailes e o balão de ar
quente que era largado, para subir e se perder ao longe, na passagem de ano
enquanto os foguetes de luzes luminosas estralejavam no ar e era lançado também
fogo de artifício. Passada a festa, o inverno continuava com os seus dias
frios, gelo, chuva, sacrifícios e brincadeiras, até que o mês de Janeiro, o
mais longo do ano, chegava ao fim e no mês de Fevereiro, os primeiros sinais da
Primavera iminente, iam-se anunciando, com o rebentar das folhas, as primeiras
flores e o verde dos campos, com as sementeiras a nascer.
Mas quando alegres se ouviam os gorjeares das primeiras
andorinhas, era a alegria geral: - Já chegaram as andorinhas! - Exclamávamos
alegremente!
Era o primeiro sinal do fim de mais um longo inverno e da
chegada da nova Primavera, com as suas flores coloridas e perfumadas, e os dias
de sol e vento cheiroso!
São algumas recordações dos Invernos da minha infância, agora
que mais um Inverno começa. Esperemos que as andorinhas voltem depressa!
Arlete Piedade Louro
Editado em " No Tempo de ... Crónicas de Outras Épocas
"
Gostámos de ler, pelo conteúdo, pelas memórias, pelo modo como está escrito. Parabéns.
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